Blood Brother

Blood Brother

Blood Brother é um documentário que relata pelas câmeras de Steve Hoover a missão de seu melhor amigo, Rocky Braat, de ajudar crianças soropositivas. Sua missão está localizada na Índia, país em que o estigma e a discriminação contra pessoas portadores de doenças infectocontagiosas causam exclusão social, circunstância que envolve numerosos casos de abandono de crianças portadoras de HIV e AIDS.

Rocky Braat, um jovem norte-americano, cansado da rotina e passando por uma crise existencial, resolve buscar autenticidade viajando para a Índia. Durante sua viagem, no sul do estado de Tamil Nadu, Braat visita um orfanato de crianças soropositivas que mudaria sua vida para sempre. Depois de um mês convivendo com as crianças, percebeu que precisava fazer mais por elas. O jovem estava encantado pela alegria e pela força de viver dos pequenos, e tocado por seu sofrimento. Disse: “Eles me deram seus corações e eu dei meu coração a eles”.  Depois de alguns meses, Braat teve que voltar para os Estados Unidos, onde refletiu sobre sua experiência e decidiu que moraria na Índia. Assim, pouco menos de um ano depois, voltou à Tamil Nadu e convidou seu melhor amigo, Hoover, para documentar sua experiência.

 Globalmente, a cada minuto nasce um bebê com HIV, transmitido por sua mãe durante a gravidez ou por intermédio do parto. Existem 3,2 milhões de crianças menores de 15 anos vivendo com HIV em todo o mundo. O governo indiano estimou que 3,5% dos 2,5 milhões de indivíduos soropositivos são crianças com menos de 15 anos de idade (Gabinete de palestrantes do Banco Mundial, 2015). A Índia é indiscutivelmente o lar do maior número de órfãos da epidemia de HIV. Essas crianças enfrentam uma barreira impenetrável em muitas sociedades indianas e sofrem estigmatização. Essa situação incentiva a ocultação da doença e desestimula as pequenas vítimas e seus responsáveis ​​de acessar os serviços essenciais disponíveis (UNICEF UK, 2010). 

Braat adapta sua vida em uma nova conjuntura, em um novo lar. Em meio a brincadeiras, sorrisos, há também a iminência de tragédias, da morte. Em uma das cenas mais comoventes, Rocky trava uma batalha de dias para que uma das crianças, internada em um hospital, não venha a falecer. Ele cuida diariamente do garoto, mesmo tendo o risco de contaminação, alimentava-o, lavava suas feridas, tratava seus curativos.  Mais uma vez, Rocky percebe que precisa se firmar na Índia legalmente para que não precisasse voltar aos Estados Unidos com frequência. Com isso, vai em busca de um casamento arranjado.

Steve Hoover, por meio do documentário, tenta entender o motivo de seu amigo ter desistido do emprego e toda sua vivência nos EUA para se voluntariar em ajudar um lar para crianças soropositivas em Tamil Nadu. Braat não teve uma infância fácil, mas o diretor do filme não foca nessa questão, querendo demonstrar que o motivo pode parecer clichê, mas não é. Sua jornada na Índia é retratada como uma coincidência: Braat, quando menos percebeu, estava apaixonado por aquelas crianças, e abandoná-las, como elas foram por seus pais biológicos, não era algo que ele poderia fazer. E diante disso, fez de sua vida ajudar o orfanato em Tamil Nadu. “Rocky Anna” é como Braat é chamado pelas crianças, “Irmão Rocky” em Tamil.

Entretanto, o documentário sofreu críticas sobre a condução das filmagens que colocou Rocky Braat como um homem altruísta e heróico — a Síndrome do Salvador Branco. É apontado que a conjuntura Índia/crianças portadoras de HIV/AIDS eram apenas complementos para sua jornada pessoal, colocando-o como uma pessoa de alta autoridade, mesmo estando em solo estrangeiro. Dessa forma, há uma crítica pós-colonial ao filme: 

A vaidade é realmente trazida à tona no documentário quando o casamento de Braat com uma linda garota local — esposa nativa troféu — é tratado como uma subtrama suculenta e seu melhor amigo torna-se lírico sobre ter mudado sua vida ao filmar experiências de quase morte e fazer um filme sobre seu amigo altruísta. Em um artigo intitulado “A vida pessoal de um cineasta é relevante para um filme? O escritor de Outro Olhar para o Irmão de Sangue”, Tom Roston, discute as conotações do Cristianismo no filme e afirma que Hoover e Braat tinham uma agenda de converter os órfãos ao Cristianismo. Ele acredita nisso porque em suas vidas pessoais eles são muito ativos na igreja, e também o filme tem sido fortemente apoiado por cristãos que o consideram um documentário “feito por discípulos”. Contudo, a maneira como Hoover escolhe concentrar toda a atenção na vida de Braat e em sua jornada emocional faz com que toda a história pareça um salvadorismo branco. Isso o coloca como uma figura de alta autoridade, embora ele esteja em solo estrangeiro. (LETTERBOX, 2014) 

O filme comove, retrata uma realidade pouco falada da conjuntura das crianças soropositivas na Índia, mas também traz reflexões pós-coloniais sobre documentários que retratam a jornada de homens brancos, ocidentais e de classe média que buscam autenticidade em países em desenvolvimentos, sendo retratados como “salvadores”.

Ana Clara Bueno

Estudante de Relações Internacionais pela UFG. Apaixonada por Direitos Humanos, Segurança internacional e Política Externa. Mescla todas suas paixões com produções cinematográficas. Futura ativista dos Direitos dos Animais.

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