JINGLES, VOTOS E AS ELEIÇÕES

_{(Foto: Presidente Bolsonaro recebe cantores sertanejos/Planalto, 2020)}

“Põe o retrato do velho de novo”, “Vinte e dois é Bolsonaro” e “Lula, lá”. Com refrões difíceis de esquecer e repetições que reforçam a popularidade dos candidatos e apelam para o carisma de cada concorrente, além das posições nos debates pré-eleição, das carreatas de bandeiras esvoaçantes e muitas discussões em jantares de família, o período eleitoral é também marcado por outros curtos e memoráveis elementos: os jingles.

“ O jingle não passa pela cabeça, vai direto para o coração”.
Bruno Hoffman, presidente do Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político em entrevista à CNN em 2022

 O ANO DAS ELEIÇÕES: 2024

Com quase metade da população mundial indo às urnas para exercer o voto, o ano de 2024 se configura como o maior ano eleitoral para as democracias, contabilizando mais de 50 países (Al Jazeera, 2024). Os impactos de cada eleição variam da posição do Estado no cenário internacional, ditando o rumo de negociações, tensões internas e conflitos externos, além de debates sobre militarismo e relações regionais. No caso de Taiwan, as eleições presidenciais significam a posição da ilha com Pequim, em meio à situação de possível intervenção do governo chinês. Para o conflito russo-ucraniano, o quinto mandato de Vladimir Putin volta a atenção para a duração da guerra, que completou dois anos em fevereiro de 2024 (Times, 2023).

_{(Foto: Alejandro Zambrana/TSE, reprodução via Wikicommons, 2022)}

No Brasil, as eleições são locais, tendo os brasileiros o poder de votar e eleger seus prefeitos, vice-prefeitos e vereadores para mandatos de quatro anos em todas as cidades do território nacional (TSE, 2024). Desta forma, até 48 horas antes das urnas serem abertas e dos mesários se posicionarem nos locais de votação, a divulgação dos candidatos se faz forte através de panfletos, bandeiras nos sinais vermelhos, mini trios, carros de som e anúncios nas mídias, que expõem sobre como a pessoa certa deve ser a escolhida. Assim, ao apelar para diferentes frentes de marketing e construir narrativas populares com o público, as campanhas criam cenários, histórias e memórias que transcendem os meses eleitorais e se sedimentam na memória popular.

O MULTIVERSO DO MARKETING POLÍTICO

Presentes nas mídias sociais, em anúncios pelas ruas, nos “santinhos”, adesivos em carros e bandeiras espalhadas por todas as cidades, o mundo da propaganda eleitoral ganha todos os holofotes nas eleições brasileiras e mundo afora. Da seleção do mercado alvo, aos produtos, tipos de anúncios e formato de entrega ao público, tudo é milimetricamente calculado para apresentar cada candidato em sua melhor forma aos eleitores,  a fim de aumentar as chances de votos. Para Mazucato (2024),

Ao utilizar técnicas de marketing, os candidatos podem identificar as necessidades, preocupações e aspirações do eleitorado, adaptando suas mensagens para melhor atender a essas demandas. Isso permite que os candidatos construam uma relação de confiança com os eleitores, mostrando que estão genuinamente comprometidos em representar seus interesses no âmbito legislativo municipal. (Mazucato, p. 7, 2024)

Disposto na Resolução Nº 23.610, de 18 de dezembro de 2019, a regulação brasileira sobre propaganda eleitoral regra a respeito dos formatos de disseminação midiática permitidos ao longo do período, sendo os jingles eleitorais uma das práticas mais aplicadas ao longo da história política nacional. Desde 1929, os jingles marcam sua presença nas campanhas brasileiras, sendo utilizados como forma de fixar o candidato na mente dos eleitores, familiarizar as pessoas e associar as pessoas, os números e as causas defendidas.

Do samba ao forró, partindo do sertanejo ao funk, as músicas que brilham nas campanhas impulsionam a visibilidade dos candidatos e atuam como fator essencial para a conquista de público alvo. Para Anastasiadou et al (2024), o marketing político possui efeito a partir do ponto em que muitos eleitores constroem seu conhecimento político através do consumo midiático, criado por meio da estrutura nacional e do que se é desejável transmitir ao público. Desta maneira, as músicas de campanha são alguns dos pilares que sustentam o que deve ou não ser apresentado a quem vota.

COM QUANTOS JINGLES SE FAZ O POLÍTICO? 

Dependendo do alvo específico, a propaganda política se torna camaleão e se adapta a diferentes interesses, ocorrendo na última década a popularização do streaming como uma forma de engajar o marketing eleitoral e atrair os olhares e a simpatia dos votantes.  Nesse sentido, adotar o que está em alta no momento e construir a imagem de pessoa do povo, é uma medida sempre presente nas campanhas, fazendo com que entre em cena o mercado paralelo de companhias especialistas em produzir material para os candidatos que desejem expandir a ala publicitária de suas campanhas (CNN, 2022).

 No mercado das propagandas políticas, as músicas que guiam o período eleitoral são diversificadas e com diferentes propósitos: começar a campanha, chamar atenção ao candidato, lançar os eleitores à vitória, passar pelas ruas, entre outros mais.  Essas músicas, então, unificam o corpo de eleitores e constroem a unidade necessária para colocar diferenças de lado e movimentar em torno de uma só causa, independentemente de qual seja, agindo como um fator transfronteiriço, diplomático e intercambiador (Global Citizen, 2015).

Ao redor do mundo, políticos utilizam da música para fortalecer suas imagens ante à população. Na corrida eleitoral em busca de um terceiro mandato, o primeiro-ministro indiano Narendra Modi junto ao seu partido Bharatiya Janata Party (BJP), lançou a campanha de reeleição com uma canção que, nas palavras de JP Nadda, presidente do partido, “apresenta sua liderança, estilo de trabalho e esforços contínuos de forma inspiracionais”. O refrão da música aponta: “nós tecemos a realidade e não sonhos. Por isso todos escolhem Modi”. (India Express, 2024).

_{(Foto: Prime Minister’s Office/Government of India, reprodução via Wikicommons)} 

Na Rússia, a música “A Man Like Putin” (traduzida com “Um homem como Putin”), lançada em 2002 pelo grupo Poyushchie Vmeste, promove a masculinidade do presidente e o coloca como modelo de homem a ser seguido pelos demais. De acordo com a letra, Putin não é apenas o homem ideal como também quase perfeito e é um exemplo cuja personalidade deve ser reproduzida pelos demais, a fim de que se tornem mais desejáveis e melhores enquanto pessoa. (Bradeis, 2020). Durante a reeleição de 2024, a visão de Vladimir Putin como um “guerreiro” foi a escolhida para a duração do período eleitoral russo, sendo o presidente retratado como uma figura forte e poderosa (The Moscow Times, 2024).

Em 2022, Jair Bolsonaro que concorria a um segundo mandato no período, organizou sua campanha dando grande peso às mídias, contendo em seus jingles o discurso nacionalista, patriarcal e familiar que promoveu durante sua gestão. Na canção “Tô com Jair de novo”, o então presidente era descrito como “arretado, competente e do povo”, além de exaltado por não se isolar da população (Poder 360, 2022). Nas eleições que o levaram à vitória em 2018, as mídias sociais também foram fortemente utilizadas, tendo o forró “Vai 17, Vai 17” viralizado nas plataformas com a letra “o Brasil é 100% Bolsonaro/o homem que une o Brasil” (Correio Braziliense, 2018).

 Somado ao grande peso dado às mídias, o ex-presidente recebeu grande impulso também do lobby agropecuário do país, com apoio público de grandes nomes do sertanejo brasileiro, como Gusttavo Lima,  Zezé Di Camargo, Chitãozinho e Sula Miranda. Os artistas, que encontraram-se com o então presidente no Palácio da Alvorada em 2022, manifestaram o apoio e  o desejo de união para o país, assim como também o descontentamento com o alto número de abstenções ocorridas durante o primeiro turno, contabilizando cerca de 30 milhões de votos. Ao apelar para sua influência no mundo da música, o cantor Leonardo comunicou, 

“Em nome da música sertaneja, estou pedindo a meus seguidores que dia 30 é Jair Messias Bolsonaro na cabeça. Vocês têm que enxergar tudo. O pior cego é que não quer ver. Vocês isentões, covardes. Sai de casa, leva seu vizinho, seu amigo. Porque foram 30 milhões de votos de abstenção. É trouxa deixar os outros escolher seu presidente. Já escolhi o meu no primeiro turno e já tá escolhido de novo” (G1, 2022) 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando trata-se de música, o diálogo pode tangenciar e tornar-se muito vago, já que dentro dos vários elementos de uma partitura, existem diversas possibilidades dentre as mais aleatórias opções de composição. Com isso em mente, um campo cheio de possibilidades é instrumentalizado pela política e torna-se por sua vez, político também, expressando os ideais, os nomes e as narrativas que desejem ser incluídas em seus curtos segundos de duração. A música assim, não marca apenas na mente de quem ouve, mas também na história do momento em que foi produzida e transforma-se em legado para o futuro, como fonte imaterial das transformações políticas que ocorrem com o descompassado ritmo do tempo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CONHEÇA AS REGRAS GERAIS PARA A DIVULGAÇÃO DE PROPAGANDA ELEITORAL. Tribunal Superior Eleitoral, [S. l.], [s. d.]. Disponível em: https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2024/Marco/conheca-as-regras-gerais-para-a-divulgacao-de-propaganda-eleitoral. Acesso em: 17 maio 2024.

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PRESIDENTE BOLSONARO RECEBE ARTISTAS E CANTORES SERTANEJOS NO PALÁCIO DO PLANALTO. Planalto, [S. l.], 2020. Disponível em: https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2020/01/presidente-bolsonaro-recebe-artistas-e-cantores-sertanejos-no-palacio-do-planalto. Acesso em: 20 maio 2024.

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