A diplomacia brasileira e a ideia de Brasil
O Brasil, sem dúvidas, se beneficiou bastante da diplomacia. Por razão dela, o país conseguiu demarcar seu território sem as sequelas do ressentimento internacional, encerrar a fase do tráfico de escravos, inserir os brasileiros no mundo pelo comércio internacional, criar e manter a unidade nacional ameaçada pela instabilidade regional, contribuir para a industrialização e o desenvolvimento econômico (RICUPERO, 2017).
Enquanto na maioria dos países hispânicos culpou-se a diplomacia por frustrar o que poderia ser conquistado no campo de batalha, pelo fracasso nas mesas de negociações, no Brasil, os diplomatas e estadistas do passado alcançaram vitórias, as quais beneficiam o país até hoje (RICUPERO, 2017). Dentre estas conquistas da diplomacia brasileira, se destaca a consolidação do território brasileiro, em uma extensão de mais de 16 mil quilômetros e compartilhando fronteiras com 10 países. Segundo Pimentel et al. (2013), as dimensões continentais do país foram definidas por meio de negociações, assim evitando-se ressentimentos regionais, que podem ser reaquecidos por lideranças oportunistas e desencadear pendências desgastantes.
Apesar dos esforços da diplomacia brasileira e dos frutos colhidos pelo Estado pela eficácia desta, não é possível afirmar que existiu uma formulação de um pensamento diplomático brasileiro, ou uma teoria diplomática que se distingue dos pensamentos já existentes, ancorados no direito internacional e em concepções políticas e econômicas dos países europeus ou americanos. Para Paulo Roberto de Almeida et al. (2013), não é possível identificar elementos imperiais ou republicanos que “representem um aporte original, ou exclusivo, ao estoque de conhecimento práticos aplicados na diplomacia imperial ou republicana”.
Assim, mesmo que os brasileiros tenham se beneficiado da diplomacia para a concretização da política externa, os instrumentos e as teorias utilizados na prática diplomática não foram inéditos nas ações tomadas pelo Itamaraty. Todos os personagens da diplomacia brasileira pensaram e trabalharam com base no estoque de conhecimentos e de experiências práticas disponíveis aos cidadãos educados de suas respectivas épocas (ALMEIDA et al., 2013). Dessa maneira, não existe um “jeitinho” brasileiro de fazer diplomacia, embora possa haver algumas peculiaridades pouco recomendáveis no plano do direito internacional (ALMEIDA et al., 2013). Logo, através das lições aprendidas, os diplomatas formularam sugestões que melhor servissem ao Brasil no contexto de suas relações regionais e internacionais (ALMEIDA et al., 2013).
A partir disso, o Brasil passou a elaborar suas políticas externas com base nos princípios do direito internacional e se inspirar nas civilizações do Norte – Europa ocidental. Para Almeida et al. (2013), o país queria ser, de certa forma, como a Europa, ter maneiras francesas, apesar de exibir um parlamentarismo de fachada e esconder um escravismo renitente. Ainda assim, o Império era de certa forma avançado, mantendo um Estado relativamente funcional e com uma unidade nacional, enquanto os países vizinhos se desmembraram no caudilhismo e nas guerras civis (ALMEIDA et al., 2013).
A partir disso, uma contribuição imperiosa da diplomacia foi a formação da ideia de um país, ou da imagem de Brasil. Para o país,
[…] graças, em primeiro lugar, ao barão do Rio Branco, com a ajuda de outros diplomatas, estadistas, pensadores, edificou-se aos poucos uma ideia de país satisfeito com seu status territorial, em paz com os vizinhos, confiantes no Direito, nas soluções negociadas, empenhado em ver-se reconhecido como força construtiva de moderação e equilíbrio a serviço da criação de um sistema internacional mais democrático e igualitário, mais equilibrado e pacífico (RICUPERO, 2017, p. 31).
A consolidação da ideia de um país, a formação da imagem do Estado, foi resultado da diplomacia brasileira, através de seus vários diplomatas, estadistas e chanceleres que conseguiram, ao longo de vários anos, dar uma ideia de nação brasileira aos outros Estados do sistema internacional.
Para entender como a diplomacia formou a identidade do Estado brasileiro, é necessário analisar quais foram as diretrizes da política externa formuladas pelos governos e o desempenho das personalidades ligadas à condução e aplicação destes planos de governo para relacionar o país com o meio internacional. Através desta análise, é possível investigar quais eram as pretensões dos chanceleres e estadistas para o Brasil e a razão pela qual adotaram tais abordagens para a condução das relações exteriores. Assim, várias são as figuras da diplomacia brasileira, as quais contribuíram imensamente para o Estado.
Entretanto, para analisar a formação da identidade internacional brasileira, foram selecionados: Alexandre de Gusmão, José Bonifácio, Barão do Rio Branco e Oswaldo Aranha, que desempenharam um papel fundamental para a boa condução da diplomacia, e os quais contribuíram para a construção do perfil do Brasil enxergado no exterior.
1. Alexandre de Gusmão (1695-1753)
Uma das figuras iniciais para o processo da consolidação da tradição diplomática brasileira foi Alexandre de Gusmão, brasileiro filho de português, que desempenhou papel crucial para o estabelecimento das fronteiras do país, que herdou dimensões continentais por razão da diplomacia de Gusmão na elaboração do Tratado de Madri.
Perdeu-se o limite estabelecido pelo Tratado de Tordesilhas, nos primórdios da colonização, em que o território brasileiro foi teoricamente delimitado. A ocupação do vale do Amazonas, a fundação da colônia de Sacramento e as descobertas auríferas do Centro-Oeste fez perder a noção do limite para as terras brasileiras (FILHO et al., 2013). Assim, os estadistas lusos expressavam preocupação em relação a um território incerto e com limites abertos, em razão das novas descobertas territoriais, as quais abrangiam a exploração de riquezas, como ouro em Minas Gerais, Goiás e Cuiabá, a plantação de cana-de-açúcar e a formação de áreas de pastagens (FILHO et al., 2013).
Dessa maneira, surgiu a necessidade de estabelecer limites fronteiriços oficiais e reconhecidos por seus adversários espanhóis. Segundo Synesio Sampaio Goes Filho et al. (2013), o Tratado de Madri foi assinado em 13 de janeiro de 1750, legalizando-se, assim, a ocupação da Amazônia, do Centro-Oeste e do Sul do Brasil, como também se abandonava o antigo sonho platino, pela cessão do território de Sacramento.
A partir das contribuições de Gusmão para a formulação do tratado que oficializou a expansão dos bandeirantes para além da linha de Tordesilhas, surge a pergunta: Qual a contribuição do Secretário de D. João V para a consolidação da ideia de uma nação brasileira? A resposta para esta pergunta envolve a noção de poder segundo Hans Morgenthau.
Morgenthau avalia quais componentes integram o poder nacional de um determinado país e quais fatores o levam a tornar-se poderoso. O autor identifica a geografia, os recursos naturais, a capacidade industrial, o grau de preparação militar, a população, a índole nacional, a moral nacional, a qualidade da diplomacia e a qualidade de governo (MORGENTHAU, 2003). Através da lista de elementos do poder nacional de Morgenthau, é possível selecionar para o caso brasileiro, e como argumento para responder à pergunta da relevância de Gusmão para a construção da imagem do Brasil, a geografia, os recursos naturais e a população. Assim, o Tratado de Madri garantiu, essencialmente, elementos de poder aos brasileiros, os quais asseguraram a posse da maior parte da Amazônia – elevando o status brasileiro na questão ambiental -, possibilitou ao país a exploração de recursos naturais para além dos limites de Tordesilhas – estanho no Norte e Centro-Oeste, ouro no Centro-Oeste e carvão no Sul – e garantiu a posição de um dos países mais populosos do mundo ao Brasil, além da importância de uma população grande para a tributação e enchimento dos cofres públicos.
Essencialmente, Alexandre de Gusmão foi o responsável por dar ao Brasil o status de potência emergente e a condição de país mais poderoso da América do Sul, o principal Estado, em termos de importância político-econômica, do Sul da América. A importância desta posição ao Brasil para a imagem brasileira? Fundamental, pois assegura com que o país seja visto, aos olhos dos outros Estados, como potência emergente e essencial para a política internacional.
2. José Bonifácio (1763-1838)
José Bonifácio foi o primeiro chanceler brasileiro, logo após a Proclamação da Independência em 1822. A gestão de Bonifácio, como ministro de Estado dos Negócios do Reino e Estrangeiros, foi marcada pelo pragmatismo da negociação para o reconhecimento da Independência com as potências europeias (ANJOS et al., 2013). Com isso, já é possível reconhecer o papel de Bonifácio para a construção da imagem brasileira perante as nações estrangeiras.
Para o chanceler, o Brasil deveria aproveitar do interesse econômico da Grã-Bretanha, da França e dos Estados Unidos e utilizá-lo como instrumento de barganha na defesa dos interesses brasileiros e não como um dado da realidade com o qual ao governo só restava conforma-se (ANJOS et al., 2013). Para isso, segundo João Alfredo dos Anjos et al. (2013), Bonifácio determinou a Felisberto Caldeira Brant, emissário brasileiro em Londres, que defendesse que o Brasil: (1) era um país independente, e que assumiria seu lugar no sistema internacional sem depender do “reconhecimento”; (2) que os portos brasileiros seriam fechados a todos os Estados que não reconhecessem a soberania e a independência brasileira. Em uma conversa entre o chanceler brasileiro e o representante britânico Henry Chanberlein, Bonifácio mantinha clara a posição do Brasil:
O Brasil quer viver em paz e amizade com todas as outras nações, há de tratar igualmente bem a todos os estrangeiros, mas jamais consentirá que eles intervenham nos negócios internos do país. Se houver uma só nação que não queira sujeitar-se a esta condição, sentiremos muito, mas nem por isso nos havemos de humilhar nem submeter à sua vontade (DRUMMOND, 1885/86, p. 45).
Não só no Ocidente o Brasil buscou reconhecimento e impor-se como Estado soberano, mas também na América do Sul. Na gestão de Bonifácio, já percebemos os primeiros passos do Brasil independente, buscando a integração e cooperação sul-americana. O primeiro passo da política externa brasileira foi, na verdade, em direção aos países hispânicos. Assim, o ministro de Estado mira no Prata, com o objetivo de estabelecer relações diretas de entendimento e cooperação com Buenos Aires (ANJOS et al., 2013). Para João Alfredo dos Anjos et al. (2013), a missão diplomática do emissário Antônio Manoel Corrêa da Câmara, submetida por Bonifácio, deveria incluir não somente a Argentina, mas também o Paraguai e o Chile.
Assim, o ministro de Estado dos Negócios do Reino e Estrangeiros defendeu a soberania brasileira e buscou cooperação e boas relações com os vizinhos. Esta fase da formação da política exterior independente brasileira é o predecessor momento da consolidação da diplomacia de Estado. Com isso, José Bonifácio, considerado patriarca da diplomacia brasileira, deu os primeiros passos para a tradição diplomática do Brasil, pela defesa dos interesses brasileiros, integração da América do Sul e pacifismo das relações estrangeiras.
3. Barão do Rio Branco (1845-1912)
José Maria da Silva Paranhos Júnior, ou mais conhecido como Barão do Rio Branco, foi a mais importante figura da diplomacia brasileira, responsável pela consolidação da política externa de Estado, a qual definiu a tradição diplomática brasileira e marcou o Brasil como ator estatal pacífico, cordial e defensor dos interesses do Sul. O chanceler atuou na gestão de 4 governos, começando no governo de Rodrigues Alves, em 1902. Para Rubens Ricupero et al. (2013), 3 são os principais elementos do Paradigma Rio Branco de Política Externa: (1) A política territorial; (2) O relacionamento assimétrico de poder com as grandes potências; (3) As relações de relativa simetria com os vizinhos.
Entretanto, há outros elementos da gestão de Rio Branco, e são estes aspectos que serão trabalhados nesta seção, a fim de tentar analisar o papel de Paranhos na construção da imagem do Estado brasileiro: O poder brando e o poder inteligente; A pacificidade e defesa do Direito e da moderação; e o sistema de organização e definição de valores superiormente nacionais.
O poder brando e o poder inteligente são conceitos formulados posteriormente à época de Rio Branco, entretanto, é notável a presença destas doutrinas modernas sobre o poder na concepção de Paranhos sobre política externa (RICUPERO et al., 2013). Em 1902, o chanceler escreveu que uma chancelaria deveria ser uma instituição baseada no conhecimento:
É preciso […] restabelecer a seção do Arquivo […] porque esse é o arsenal em que o Ministro e os empregados inteligentes e habilitados encontrarão as armas de discussão e combate. É preciso criar uma biblioteca e uma seção geográfica na Direção do Arquivo, como em França, Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos (LINS, 1945, p. 748-749).
Este poder brando mostra-se eficiente no conflito sobre o Acre. O país quase entra em guerra contra um vizinho, quebrando a tradição iniciada em 1870 com o fim da Guerra do Paraguai. Assim, Rio Branco conseguiu anexar o Acre ao Brasil, território previamente parte da Bolívia, através de compensações – Tratado de Petrópolis -, reforçando, na Exposição de Motivos do Tratado de Petrópolis, que “as maiores vantagens da aquisição territorial que resultam desse tratado não são as materiais. As de ordem moral e política são infinitamente superiores” (RIO BRANCO, 2012).
A partir disso, o poder brando e o poder inteligente penetram na política externa de Estado. Tendo em vista que o Brasil não é uma potência militar com capacidade de resolver seus problemas através do poder bruto, o poder brando aparece como uma alternativa, uma estratégia que tornou-se útil ao Brasil, pelos resultados positivos obtidos pelo soft power.
Além da questão do poder, Paranhos contribuiu mais do que nenhum outro para a elaboração do conceito de um país fiel à paz e ao Direito (RICUPERO et al., 2013). Assim, o amor ao Direito, a generosidade, a moderação seriam atributos essencialmente brasileiros, que marcariam o país (RICUPERO et al., 2013). Em um discurso no Clube Militar em 1911, pouco antes de sua morte, Rio Branco diz que se algum dia:
[…] pensarem alguns destes países latino-americanos em entregar-se à loucura das hegemonias ou ao delírio das grandezas pela prepotência estou persuadido de que o Brasil do futuro há de continuar invariavelmente a confiar acima de tudo na força do Direito e, como hoje pela cordura, desinteresse e amor da justiça, a conquistar a consideração e o afeto de todos os povos vizinhos em cuja vida interna se absterá de intervir (LINS, 1945, p. 774).
Assim, a partir deste discurso, conclui-se que Rio Branco aspirava um país que naturalmente obedeceria o Direito Internacional, a não intervenção e o respeito à soberania de seus vizinhos americanos. Isso, tão intrínseco à natureza da política externa brasileira, que seria reconhecido pelos Estados do sistema internacional, os quais descartaram qualquer possibilidade de conflito incitado pelo Brasil.
Além disso, Gilberto Freyre classifica o Itamaraty de Rio Branco como uma instituição que transformou-se em um sistema de definição de valores superiormente nacionais, sistema tal em que o Barão comunicou sua imagem de superprotetor de uma pátria, a qual necessitava do respeito dos europeus e dos anglo-saxões, para crescente afirmação do seu prestígio (FREYRE, 1959).
Estes “valores superiormente nacionais” que Freyre sugeriu, traduzem-se como valores que estavam acima da situação real do país, marcado pelo atraso econômico, pela Revolta da Vacina e pelo analfabetismo atingindo 80% da população (RICUPERO et al, 2013). Assim, o Brasil cordial e amigável com os outros países sofria de uma realidade político-econômica diferente da imagem vendida ao exterior – de uma nação desenvolvida e com bons indicadores socioeconômicos.
Entretanto, as conquistas diplomáticas de Rio Branco – no Acre e nas demais negociações de fronteira – restituíram, de certa forma, a autoestima aos brasileiros humilhados pelos problemas políticos, os quais pareciam em fazer do país em mais uma republiqueta latino-americana (RICUPERO et al, 2013).
Por fim, segundo Rubens Ricupero et al. (2013), a consolidação do ideário externo nacional pelo Barão, em termos de objetivos e métodos, foi internalizada de forma tão completa e profunda que passou a ser impossível pensar um Brasil de personalidade internacional diferente.
Logo, é tão evidente a contribuição de Paranhos à imagem do Estado brasileiro, pois, através da análise da tradição diplomática brasileira, é notável como a política externa foi aplicada ao decorrer dos anos, a fim de manter os valores brasileiros de respeito ao Direito Internacional, de soluções negociadas, de prática à não intervenção e de pacifismo, todos consolidados na gestão das relações exteriores de Rio Branco.
4. Oswaldo Aranha (1895-1960)
Oswaldo Aranha foi uma figura importante para a política externa brasileira, e também para o reconhecimento do Brasil como um país empenhado nos princípios fundamentais da ONU. Assumiu o Ministério das Relações Exteriores no primeiro governo de Vargas e depois foi o único brasileiro a ser eleito para ocupar a presidência da Assembleia Geral das Nações Unidas. Assim, convém utilizar o recorte temporal que engloba o trabalho de Aranha como chanceler de Vargas até sua participação na II Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1947.
Como chanceler de Vargas contribuiu de forma efetiva para a participação brasileira na Segunda Guerra, como também para as definições de rumos do Brasil durante o conflito mundial, que iria promover os valores brasileiros e defendê-los no plano internacional (LIMA; ALMEIDA; FARIAS, 2017). Assim, as duas Guerras Mundiais foram acontecimentos de notável atuação do Brasil, em que “no exercício do planejamento militar, a logística no Atlântico Sul, sua projeção no norte da África, e a disponibilidade de matérias-primas para o esforço de guerra permitiram aos Aliados estratégia e mobilidade inconcebíveis se tivesse sido outra a opção feita pelo Brasil” (LIMA; ALMEIDA; FARIAS, 2017, 21-22).
Após o término da Grande Guerra, o Brasil esteve presente na Conferência de São Francisco, que aprovou a Carta de São Francisco, a qual criou, em 26 de junho de 1945, a Organização das Nações Unidas. Diante da excepcional ajuda prestada pelos brasileiros nas duas Guerras Mundiais, os Estados Unidos chegou a propor o Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança, porém, Inglaterra e União Soviética opuseram-se (CERVO, 2009).
É interessante destacar, que o Brasil apresentou um discurso amargurado na primeira sessão da Assembleia Geral. O embaixador Pedro Leão Velloso Neto revelou expectativas positivas em relação em torno dos ideais da Organização, porém não deixou de afirmar nas entrelinhas o ressentimento brasileiro de não ter sido elevado, apesar do esforço do Brasil na Guerra. Assim, ainda estavam vivas as sequelas do episódio da retirada do Brasil da Liga das Nações ao não serem atendidas as pretensões brasileiras de um assento permanente no Conselho (CORRÊA et al, 2007).
Entretanto, já como chefe da delegação brasileira em 1947, Oswaldo Aranha foi eleito presidente da Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU, quando desempenhou papel crucial nos entendimentos que levaram à resolução que estabeleceu a partilha do mandato britânico da Palestina em dois futuros Estados: um judaico e outro árabe. A posteriori, esta decisão da ONU assegurou a criação do Estado de Israel (LIMA; ALMEIDA; FARIAS, 2017).
Após o término da Sessão Especial, era a hora de eleger o presidente definitivo da Segunda Sessão. Dessa maneira, o Itamaraty não concordava com a candidatura de Aranha à presidência, porque isto poderia atrapalhar a ação do país no Conselho Econômico e Social. Entretanto, representantes latino-americanos lançaram a sua candidatura, e Oswaldo Aranha foi eleito o presidente da II Sessão da Assembleia Geral (LIMA; ALMEIDA; FARIAS, 2017).
A contribuição de Aranha nas duas Sessões marcaria para sempre o Brasil na ONU. Diante da participação brasileira junto aos Aliados nas duas Guerras e na Organização, o Brasil seria para sempre lembrado de sua contribuição, ao ser o primeiro a discursar nas Assembleias Gerais.
Contrário à grande maioria das delegações que discursam no Debate Geral, mais preocupados com questões tópicas e de interesse de seus países, os Chefes de Delegação do Brasil, por serem os primeiros a falar, costumam apresentar discursos abrangentes, avaliando a situação internacional, e assim, reafirmando a posição brasileira em relação às principais questões internacionais (CORRÊA et al, 2007).
Logo, a participação brasileira junto à ONU assegurou ao Brasil um prestígio internacional, reforçando a imagem dos brasileiros e da efetiva diplomacia brasileira. A partir da contribuição do Brasil à Organização, o país ficaria eternamente marcado como uma nação defensora dos princípios fundamentais da ONU, princípios, hoje, fortemente defendidos pela comunidade internacional.
CONCLUSÃO
Não é possível definir uma teoria diplomática que seja essencialmente brasileira, pois a diplomacia brasileira utilizou de estudos já elaborados e métodos já utilizados na Europa. Assim, os formuladores e condutores da política externa utilizaram-se do conhecimento já existente para elaborar uma tradição diplomática brasileira baseada no soft power – ou poder brando, referente ao poder de influência de um país a partir da cultura, diplomacia ou qualidades não militares.
Na época do Barão de Rio Branco, o chanceler viu a lacuna de um hard power brasileiro, e, dessa maneira, utilizou o poder brando e o poder inteligente para conduzir as relações exteriores, aliando o conhecimento e a capacidade de usar com sabedoria o poder limitado que o Brasil possuía.
Este poder limitado, que o país já detinha na época de Rio Branco, pode-se atribuir a responsabilidade a Alexandre de Gusmão, o qual contribuiu imensamente para a assinatura do Tratado de Madri, que oficializou o território expandido para além da linha de Tordesilhas. Gusmão, em essência, assegurou ao Brasil elementos de poder que impuseram o país no sistema internacional.
José Bonifácio defendeu a soberania brasileira e buscou cooperação e boas relações com os vizinhos. Esta fase da formação da política exterior independente brasileira é o predecessor momento da consolidação da diplomacia de Estado. Com isso, Bonifácio, considerado patriarca da diplomacia brasileira, deu os primeiros passos para a tradição diplomática do Brasil, pela defesa dos interesses brasileiros, integração da América do Sul e pacifismo das relações estrangeiras.
Oswaldo Aranha consolidou de vez a identidade internacional brasileira com seus trabalhos na Organização das Nações Unidas. A participação brasileira junto à ONU na época de Aranha, assegurou ao Brasil um prestígio internacional, reforçando a imagem dos brasileiros e da efetiva diplomacia brasileira. A partir da contribuição do Brasil à Organização, o país ficaria eternamente marcado como uma nação defensora dos princípios fundamentais da ONU, princípios, hoje, fortemente defendidos pela comunidade internacional.
A partir das contribuições dos 4 estadistas analisados neste artigo, é possível afirmar que a diplomacia brasileira foi a responsável por consolidar a identidade internacional do Brasil. Através das contribuições de Gusmão, Bonifácio, Rio Branco e Aranha, consolidou-se a política externa de Estado do Brasil, empenhada na proteção dos Direitos Humanos, do meio ambiente, na solução dos problemas humanos sem a pretensão de se tornar uma hegemonia militar, por meio de uma diplomacia baseada na conciliação, moderação, persuasão e exemplo. Logo, foi graças à diplomacia, que houve a internalização dos valores históricos de igualdade e paz pelos brasileiros.
Bibliografia
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FREYRE, Gilberto. Ordem e Progresso. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1959.
LIMA, Sérgio E. Moreira; ALMEIDA, Paulo Roberto de; FARIAS, Rogério de Souza. Oswaldo Aranha: um estadista brasileiro. Brasília: FUNAG, 2017.
LINS, Álvaro. Rio-Branco. (O Barão do Rio Branco: 1845-1912). Rio de Janeiro: J. Olympio, 1945, 2 v.
MORGENTHAU, H. J. A política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz. Brasília: Editora Universidade de Brasília: Instituto de Pesquisa em Relações Internacionais; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2003.
PIMENTEL, José Vicente de Sá (org.). Pensamento diplomático brasileiro: formuladores e agentes da política externa (1750-1950). Brasília: FUNAG, 2013.
RICUPERO, Rubens. A diplomacia na construção do Brasil 1750-2016. 1 ed. Rio de Janeiro: Versal Editores, 2017.
RIO BRANCO, Barão do. Obras do Barão do Rio Branco. Brasília: FUNAG, 2012.
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