A RESISTÊNCIA DA BIBLIOTECÁRIA DE AUSCHWITZ

A RESISTÊNCIA DA BIBLIOTECÁRIA DE AUSCHWITZ

A vida retoma seu curso quando nos preocupamos com coisas pequenas.

A Bibliotecária de Auschwitz, Antonio G. Iturbe.

A Bibliotecária de Auschwitz é um livro biográfico escrito por Antonio G. Iturbe. O autor tomou como base a história de Dita Dorachova, uma menina de 14 anos que foi enviada para o famoso e cruel campo de concentração que foi Auschwitz. Na obra, a jovem, juntamente com seu professor, Fred Hirsch, se uniu para cumprir uma missão arriscada e secreta: ensinar crianças presentes a ler e a ter um grau de educação em meio ao caos em que viviam.

Hirsch, que era um professor de óculos delicados, conseguiu a permissão dos alemães para criar um projeto para entreter os meninos e meninas do pavilhão 31 do campo — esse projeto visava a criação de peças que seriam apresentadas aos oficiais e de atividades conjuntas. Como justificativa, afirmou que o trabalho delas seria mais produtivo se tivessem essa distração, e, assim, os nazistas concordaram e lhe deram as seguintes condições: não haveria qualquer forma de educação formal para os pequenos ali e livros era estritamente proibidos.

Contexto

Após o acordo com os oficiais, Fred colocou-se sob risco ao contrabandear e esconder livros educativos no local em que dava aulas. O professor, em conjunto com outros adultos que trabalhavam no campo, oferecia essa pequena oportunidade aos jovens que estavam ali bem como a seus pais. Inicialmente, a iniciativa não apresentava muitos riscos aos alunos, todavia, as vistorias dos oficiais alemães tornaram-se mais frequentes.

Em virtude disso, a situação inflamou-se de tal maneira que, em um encontro não previsto, um dos livros proibidos não foi escondido. Assim, uma aluna de 14 anos, chamada Dita, o colocou dentro do vestido, pondo sua vida em risco a fim de proteger o seu professor e todos os outros que frequentavam à escola do pavilhão 31. Com essa atitude, Fred Hirsch percebeu que ela poderia ser uma ajudante inusitada, e ofereceu-lhe a oportunidade de ler e proteger os 8 livros que eles tinham.

Haverá quem não partilhe este fascínio pelo fato de alguns terem arriscado a vida para manterem aberta uma escola secreta e uma biblioteca clandestina em Auschwitz-Birkenau. Haverá quem pense que foi um ato de coragem inútil num campo de extermínio, quando há outras preocupações mais prementes: os livros não curam doenças nem podem ser usados como armas para derrotar um exército de carrascos, não enchem o estômago nem matam a sede. É verdade: a cultura não é necessária para a sobrevivência do homem, bastam o pão e a água. Se o homem não se emociona com a beleza, se não fecha os olhos e põe em marcha os mecanismos da imaginação, se não é capaz de interrogar-se e vislumbrar os limites da sua ignorância, é homem ou é mulher, mas não é pessoa; nada o distingue de um salmão, de uma zebra ou de um boi.

A Bibliotecária de Auschwitz, Antonio G. Iturbe.

A paixão pelo ofício

Dita Dorachova, a partir desse encontro, decidiu que ajudaria Hirsch a esconder os livros, e que também se arriscaria contrabandeando os que pudesse, tornado-se a “bibliotecária de Auschwitz”. A garota separou produtos que tinham valor no local um pedaço de pão ou de batata, um botão para trocar por uma costura especial de um bolso em seu vestido, para que, assim, pudesse guardar os livros.

Nesse processo, ela compreendeu como a leitura era algo importante e acolhedor. A jovem criou uma conexão com os poucos livros que tinha ali, e eles serviam como uma válvula de escape para as tragédias que aconteciam ao seu redor, como um abrigo que a protegia momentaneamente dos medos existentes em Auschwitz. Ademais, a existência desses pontos de resistência deram-lhe esperança para que, um dia, conseguisse sair daquele lugar.

A menina tinha o vínculo que une algumas pessoas aos livros. Uma cumplicidade que ele próprio não possuía, por ser ativo demais para se deixar fisgar por linhas e linhas de impressas em páginas. Fred preferia a ação, o exercício, as canções, o discurso… Mas se deu conta de que Dita tinha essa empatia que faz com que certas pessoas transformem um punhado de folhas num mundo inteiro só para elas.

A Bibliotecária de Auschwitz, Antonio G. Iturbe.

A fragilidade da vida

Durante a obra, um ponto que é tratado é a fragilidade da vida. Como, diariamente, professores e alunos corriam o risco de não comparecerem às aulas, não só em razão da fome ou das doenças, mas também por causa dos conflitos com os oficiais alemães, do suicídio, das condições de trabalho forçado, entre muitos outros motivos, o tema “morte” era muito pensado por todos durante a narrativa.

— Senhora…

— Meu marido? — pergunta ela com a voz falhando. — Piorou?

— Morreu.

Como se pode resumir uma vida em apenas uma palavra tão curta? Como pode caber tanta desolação em tão poucas letras?

A Bibliotecária de Auschwitz, Antonio G. Iturbe.

Inclusive, um dos indivíduos que mais trazia medo à Dita era o famigerado médico Josef Mengele. Ele trabalhava no campo e retirava as crianças do pavilhão 31 para realizar seus experimentos cruéis, os quais resultavam na morte de bebês, crianças e adolescentes. Durante uma cena presente no livro, o médico teve um encontro com a bibliotecária, entretanto, ela não foi submetida a sua tortura do homem e não foi mais procurada pelo homem conhecido como o “Anjo da Morte”.

Conclusão

A Bibliotecária de Auschwitz é um livro extremamente emocionante, que revela a forma como coisas simples, como o acesso a livros ou o apoio de um amigo e de um professor, pode trazer um pouco de conforto em meio a uma situação tão dolorosa quando a de Dita. De mesmo modo, compreender que o que é lido tem como base uma história real, e que as situações descritas muito provavelmente aconteceram, é algo que incendeia as críticas do leitor contra qualquer forma de opressão e perseguição como a que aconteceu no Holocausto.

Outro ponto que eu queria trazer é a forma em que, durante a narrativa, o tópico de importância dada aos pequenos momentos e às pequenas coisas é sempre ressaltada. Mesmo num panorama de desespero, Dita encontrava uma forma de ter esperança e de torcer para que as coisas funcionassem. De desejar sair de Auschwitz. Ver como uma menina de 14 anos, sob um risco incalculável por causa dessa missão proibida, ainda buscava a felicidade faz com que a gente reflita sobre o que realmente importa para nós.

É um livro para se levar para a vida.

— Foram felizes, Edita.

— Mas durou tão pouco…

— A vida, qualquer vida, dura muito pouco. Mas se conseguimos ser felizes, ao menos por um instante, terá valido a pena.

A Bibliotecária de Auschwitz, Antonio G. Iturbe.

Talita Soares

Formada em RI pela UFG, leitora nas horas vagas.

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